quarta-feira, 7 de setembro de 2011

Fortaleza Verde

Cresce o número de feiras agroecológicas
 
A ideia é fazer chegar aos consumidores a produção da agricultura familiar eliminando os atravessadores
 


 
Os agricultores do Sertão do Pajeú (PE) realizavam, todos os anos, em comemoração à Semana do Meio Ambiente, uma feira para comercializar produtos oriundos da agricultura familiar. Em 2000, resolveram instituir a Feira Agroecológica de Serra Talhada (Fast), no município de mesmo nome, distante 415 Km de Recife. Desde então, todos os sábados, o empreendimento atrai centenas de consumidores que abandonaram a feira tradicional em busca de alimentos saudáveis.

Na terra do xaxado, onde nasceu Virgulino Ferreira da Silva, o Lampião, considerado rei do cangaço, a busca por produtos "limpos", sem agrotóxicos, virou uma salutar mania. "Desde o primeiro dia frequento a feira. Aqui é um ponto de encontro da sociedade. A gente vem para cá, enquanto as nossas famílias fazem as compras, e aproveita para colocar o papo em dia", conta o comerciante Rémulo Alencar.

Kelle Souza, técnica em agropecuária que acompanha a feira todos os sábados, frisa que o que é vendido ali é produzido de forma organizada pelos agricultores da região. "Tudo é definido por eles, desde o que vão comercializar, o processo de produção agroecológica e até os preços que serão praticados".

A Fast é acompanhada pelo Centro de Educação Comunitária Rural (Cecor), que presta serviço de assistência técnica às famílias agricultoras. "Um dos principais objetivos alcançados nesse tempo foi construir uma clientela fiel e uma relação muito mais igualitária entre produtor e consumidor.

Esse, aliás, é o grande diferencial entre uma feira agroecológica e a convencional. Aqui não é um ato de comprar e vender somente e sim o estabelecimento de uma relação mais próxima, mais confiável, onde, por exemplo, os consumidores indicam os produtos que gostariam de consumir e eles são trazidos para cá", enfatiza Expedito Brito Brasil, coordenador geral do Cecor.

Kelly Souza lembra que a Fast é certificada. "É um trabalho importante desenvolvido pelo Cecor, que forma grupos de consumidores para observar a questão social da produção e garantir o processo agroecológico, limpo e em harmonia com o meio ambiente. Temos toda uma metodologia de incentivar o processo de cultivo ambiental, que começa dentro das organizações com a capacitação".

Dentre outras medidas, há o incentivo para o uso de defensivos naturais, cobertura morta, o trabalho de conservação dos recursos hídricos das propriedades e do seu entorno. Um dos principais motivos do surgimento das feiras agroecológicas foi eliminar o atravessador.

Natureza

Sílvia Lúzia Mendes, 42 anos, é proprietária de uma banca que vende banana, leite, queijo, ovos, galinha. "Tudo é produzido na minha terra, um hectare. Antes eu trabalhava na feira convencional. Quando entrei em contato com o pessoal do Cecor, achei interessante o sistema agroecológico de produzir, até porque preserva a natureza, e resolvi participar. Estou desde então todos os sábados aqui. Um detalhe interessante é que os consumidores da feira agroecológica são mais amigos. Estabelecemos uma relação mais cordial. A gente vende quase tudo. Quando sobra alguma coisa, repassamos para um colega e depois prestamos conta.

Em Turmalina MG), a 490 Km de Belo Horizonte acontece às terças-feiras e aos sábados uma das mais expressivas feiras agroecológicas do semiárido brasileiro.

A Feira de Turmalina é organizada pelo Centro de Agricultura Alternativa Vicente Nica (CAV), que é uma organização não-governamental (ONG) criada em 1994 por agricultores familiares do município de Turmalina, no Vale do Jequitinhonha com o objetivo de superar o alto índice de migração, devido à acentuada degradação das terras pelo uso de técnicas inadequadas e insustentáveis, aliada à falta de políticas públicas voltadas à agricultura familiar, como infraestrutura de produção, beneficiamento e escoamento para a comercialização, assistência técnica e crédito.

Pesquisa

O coordenador do CAV, Valmir Soares de Macedo, explica que, a partir de uma pesquisa realizada pela Universidade Federal de Lavras, entre 2001 e 2002, constatou-se potencial bastante grande na região, ou seja, "se aqui havia bastante produção, também havia um mercado produtor para ser abastecido. A partir daí a gente também entendeu que, além das potencialidades, tinha muitas dificuldades, desde assistência técnica até agregação de valor ao produto, e comercialização. Daí o CAV iniciou o trabalho de assessorar esses agricultores por meio de demanda deles mesmos e por meio do que foi apurado na pesquisa. Com o trabalho de assistência técnica, fundou-se uma associação no sentindo de melhor organizar os agricultores e captar recursos para algumas benfeitorias".

João Batista Afonso, 59 anos, levanta à seis horas em dias normais e às quatro em dia de feira quando tem que se deslocar 11 quilômetros da comunidade de Lagoa até a sede de Turmalina. Para ele, o CAV dinamizou o setor de compra de insumos, as vendas e trouxe tecnologias novas. Com isso, a renda tem melhorado. "Aprendi a conservar o solo". Maria Lourivanda Macedo Rocha, 49 anos, que mora em Morro Redondo, a nove quilômetros de Turmalina, garante que "melhoraram as práticas de cultivo e também a forma de comercializar".

Bodega

Para comercializar seus produtos cultivados com métodos sustentáveis, agricultores familiares de Soledade (PB), distante 165 Km de João pessoa, ao invés de uma feira, preferiram uma bodega agroecológica, que funciona na Rua Doutor Gouveia Nóbrega, no Centro da cidade, por onde passa a linha interurbana de ônibus Campina Grande/Sertão.

"É muito bom dispormos de algo assim em Soledade. A principal vantagem é que sabemos que tudo que tem aqui é puro, limpo, não tem agrotóxicos nem venenos. Comer queijo e mel adquiridos na bodega agroecológica é a certeza de que não haverá qualquer tipo de problema. As frutas e hortaliças são de primeira qualidade", conta seu Antônio Sampaio, conhecido como seu Tota, 62 anos.

Silvana Moraes, que trabalha como atendente no local, esclarece que existe uma coordenação, um coletivo responsável pela bodega, que atende aos municípios de Soledade, Juazeirinho, Pedra Lavada, São João do Cariri, Santo André e Pocinhos, dentre outros. "Os produtos procedem da agricultura familiar, de subsistência. Os agricultores trabalham em suas propriedades com produtos caseiros".

Surgimento
2000 foi o ano de criação da feira de Serra Talhada (PE), que completou 11 anos de atividades atendendo, aos sábados, à demanda da cidade e de municípios circunvizinhos.


Fonte: Diário do Nordeste
MARISTELA CRISPIM E FERNANDO MAIAEDITORA/REPÓRTER